Este glossário está em contínuo desenvolvimento e foi elaborado com o objetivo de reunir e esclarecer conceitos fundamentais para compreender e fortalecer as práticas antirracistas, educacionais e culturais desenvolvidas pelo Movimento Negro de Heliópolis e região. Cada termo reflete aspectos essenciais da luta pela justiça social, a valorização da identidade negra e o combate às desigualdades estruturais que impactam as comunidades periféricas. Inspirado por saberes ancestrais, perspectivas críticas e vivências locais, este glossário serve como uma ferramenta de educação e empoderamento, promovendo reflexões e ações que transformam realidades e constroem um futuro mais justo e inclusivo.
Termos fundamentais para as ações do Movimento Negro de Heliópolis e região
- Antirracismo: A prática ativa e consciente de combater o racismo em todas as suas formas, promovendo justiça social e equidade.
- Apropriação cultural: o uso, por grupos dominantes, de elementos culturais de grupos marginalizados sem reconhecimento, respeito ou contexto, transformando essas expressões em mercadorias e apagando seus significados originais.
- Bem viver: uma filosofia que valoriza a harmonia com a comunidade, a natureza e a ancestralidade, promovendo uma vida coletiva baseada em respeito, solidariedade e justiça social, como alternativa às dinâmicas individualistas e exploratórias.
- Capitalismo: um sistema econômico que privilegia a acumulação de capital e a exploração da força de trabalho, reforçando desigualdades sociais e raciais, especialmente em territórios periféricos como Heliópolis.
- Colonialismo: um sistema de dominação política, econômica e cultural que subordinou povos e territórios à exploração e controle de potências coloniais, deixando marcas profundas de desigualdade e racismo estrutural.
- Colorismo: uma forma de discriminação que valoriza tons de pele mais claros em detrimento de tons mais escuros dentro de grupos racializados, reforçando hierarquias raciais e perpetuando o racismo estrutural.
- Cotas Raciais: políticas afirmativas que garantem o acesso de pessoas negras a espaços de educação, trabalho e outros direitos historicamente negados, como forma de combater desigualdades estruturais e promover a inclusão.
- Cultura afro-brasileira: a expressão das heranças africanas no Brasil, que se manifesta em formas de arte, religião, culinária, dança, tecnologias e modos de vida, sendo fundamental para a identidade e resistência das populações negras.
- Decolonialidade: uma perspectiva crítica que desafia as hierarquias impostas pelo colonialismo, valorizando saberes e práticas negras como ferramentas de resistência e transformação.
- Democracia: o sistema de organização social e política que garante a participação ativa e igualitária de todas as pessoas, sendo um instrumento essencial para combater as desigualdades raciais e fortalecer a luta por direitos e justiça social.
- Diáspora africana: o movimento histórico de africanos e seus descendentes pelo mundo, incluindo o Brasil, que resultou na criação de conexões culturais, sociais e políticas entre diferentes territórios, fortalecendo a identidade e a luta negra global.
- Direito à cidade: a luta pela construção de territórios inclusivos e democráticos, garantindo moradia digna, educação e cultura para a população negra de Heliópolis.
- Educação antirracista: a promoção de uma pedagogia que valoriza a história e a cultura negra, desconstruindo preconceitos e contribuindo para uma sociedade mais justa.
- Encarceramento em massa: o aprisionamento desproporcional de pessoas negras, resultado do racismo estrutural que criminaliza e marginaliza a população periférica, agravando as desigualdades sociais e violando direitos humanos.
- Feminismo negro: um movimento que une a luta contra o racismo e o sexismo, destacando as experiências específicas de mulheres negras, que enfrentam múltiplas formas de opressão e propõem caminhos de resistência e transformação social.
- Genocídio: a sistemática eliminação de grupos sociais ou étnicos, que no Brasil se manifesta pelo alto índice de homicídios de jovens negros e pela negação de direitos fundamentais como saúde, educação e segurança.
- Interseccionalidade: a análise das desigualdades que considera as múltiplas formas de opressão, como raça, gênero e classe, que afetam as vivências de pessoas negras.
- Injúria racial: o ato de ofender, com palavras ou gestos, a dignidade de alguém em função de sua raça ou cor, considerado crime no Brasil (Lei 14.532/2023).
- Intolerância religiosa: a discriminação e o preconceito dirigidos a práticas e crenças religiosas, com destaque para a perseguição de religiões de matriz africana, frequentemente marginalizadas e criminalizadas no Brasil.
- Letramento racial: refere-se ao processo de adquirir conhecimento, habilidades e consciência crítica para identificar, compreender e questionar o racismo em suas diversas formas. Esse conceito inclui o aprendizado sobre a história, as dinâmicas e as estruturas do racismo, bem como suas implicações sociais, culturais e políticas. O letramento racial busca capacitar indivíduos e comunidades a reconhecerem privilégios, desigualdades e práticas racistas, além de promover ações conscientes de enfrentamento e transformação para uma sociedade mais justa e igualitária.
- Lugar de fala: o reconhecimento da posição social e histórica de cada indivíduo como determinante para suas vivências e perspectivas, enfatizando a importância de dar voz às pessoas negras para que relatem suas próprias experiências e lutas.
- Memória histórica: o resgate e a valorização da história e das contribuições do povo negro como instrumentos de resistência e fortalecimento da identidade coletiva.
- Mito da democracia racial: a ideia de que no Brasil existe igualdade racial e convivência harmoniosa entre os diferentes grupos étnicos, encobrindo as desigualdades estruturais, o racismo e a violência histórica sofrida pela população negra.
- Neoliberalismo: uma ideologia que promove o mercado como solução central para todas as questões sociais, reduzindo o papel do Estado e enfraquecendo políticas públicas voltadas para a equidade, agravando desigualdades estruturais e raciais.
- Políticas públicas: conjuntos de ações e programas desenvolvidos pelo Estado para atender às necessidades sociais, promover direitos e reduzir desigualdades, com especial relevância para a promoção da igualdade racial e o combate ao racismo estrutural.
- Racismo: uma forma de discriminação baseada em ideias de superioridade racial, que marginaliza pessoas negras e perpetua desigualdades históricas.
- Racismo estrutural: conjunto de práticas, políticas e normas que reforçam desigualdades raciais em todos os níveis da sociedade, desde a economia até a educação e a saúde.
- Racismo institucional: a manifestação do racismo dentro de instituições públicas e privadas, impactando negativamente o acesso e o tratamento igualitário de pessoas negras em serviços e oportunidades.
- Representatividade: o reconhecimento e a valorização da presença negra em espaços de poder, cultura e educação, reforçando identidades e promovendo igualdade de oportunidades.
- Ubuntu: o princípio africano que reforça a coletividade, a solidariedade e o reconhecimento mútuo, guiando as ações comunitárias do movimento.
O glossário não apenas define palavras, mas também conecta histórias, lutas e valores que sustentam o trabalho do Movimento Negro de Heliópolis e região. Ele é um convite à reflexão, à conscientização e à prática coletiva do antirracismo, valorizando a cultura, a memória e a resistência da população negra. Este material está em constante construção, aberto às contribuições que ampliem e fortaleçam a luta por equidade e reconhecimento. Afinal, as palavras têm poder: são sementes que, plantadas no terreno fértil da solidariedade e da justiça, germinam mudanças profundas e duradouras.
Os termos aqui definidos expressam conceitos que fundamentam as práticas e ações do Movimento Negro de Heliópolis região, que busca transformar o território em um espaço de justiça, solidariedade e igualdade para todos, onde o Bem Viver seja uma realidade possível.
Referências
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A elaboração deste Glossário Antirracista foi possível por conta do “Projeto 365 Dias Sendo Preto”, contemplado pela 4ª Edição do Edital Apoio à Cultura Negra da cidade de São Paulo.