Em uma conversa inspiradora com jovens articuladores do Projeto “365 Dias Sendo Preto” (contemplado pela 4ª Edição do Edital Apoio à Cultura Negra da cidade de São Paulo), Ricardo Lima da Silva, mais conhecido como Kadu Silva, assistente social e pesquisador, trouxe à tona reflexões profundas sobre o impacto do Movimento Negro na vida de pessoas negras e nas periferias urbanas. O bate-papo, relacionado à Plenária Mirim “Passa ou Repassa Antirracista” (que também compõe uma das ações do projeto para a qual Kadu foi convidado), reforça o poder da representatividade, da reparação histórica e do empoderamento coletivo.
Para Kadu Silva, sua trajetória no Movimento Negro é um processo de reparação e afirmação. Ele reflete sobre a infância marcada pela ausência de referências positivas: “Nós, garotos negros, tínhamos pouca ou quase nenhuma referência. Negros na mídia, em posições de poder ou como padrão de beleza eram raros.” Esse cenário, segundo ele, impacta profundamente a saúde mental e a autoimagem de jovens negros. No entanto, projetos como “365 Dias Sendo Preto” buscam mudar essa narrativa, oferecendo espaços de acolhimento, aprendizado e valorização da negritude.
Durante o bate-papo, Kadu destacou como o Movimento Negro atua não apenas no resgate da memória, mas também na construção de futuros mais justos. A iniciativa vai além de ações culturais e educativas; ela representa uma luta política contra a colonialidade e o racismo estrutural que ainda persistem no Brasil. “Pensar em reparação histórica no Brasil pós-abolição é emergente. O poder eurocêntrico ainda mantém seu domínio em nossa cultura, mas o Movimento Negro nos ensina a resistir e a ocupar espaços historicamente negados”, afirmou.
A Plenária Mirim, outra ação marcante do projeto, exemplifica essa abordagem. Com participação de Kadu e dos jovens articuladores Vinícius Gonçalves e Gustavo Mesquita Ribeiro, a plenária deu voz às novas gerações, permitindo que refletissem sobre suas realidades e sonhassem futuros possíveis. “Quando estamos aqui, criamos um espaço político, de força e afirmação. Mostramos que nossas histórias importam e que podemos ser os protagonistas das mudanças que queremos ver”, declarou Kadu.
Sua própria jornada como homem negro e gay é vista como um exemplo de superação e inspiração. Ele enfatizou a importância de se tornar visível para desafiar narrativas racistas e abrir caminhos para as futuras gerações. “Quando me coloco neste espaço, é para mostrar que é possível ser referência, sócio-educador, artista ou o que quiser. É possível sonhar futuros, mesmo em um cenário que muitas vezes nos nega essas possibilidades.”
O Projeto “365 Dias Sendo Preto”, realizado pelo Movimento Negro de Heliópolis e região em parceria com a UNAS e a Prefeitura de São Paulo, por meio do 4º Edital Culturas Negras, promovido pela Secreteria Municipal de Cultura, tem como um dos focos principais conectar memória, identidade e ação comunitária. Ao longo de suas atividades, o projeto reforçou a importância de discutir temas como raça, racismo e negritude de forma inclusiva, oferecendo acessibilidade em Libras e criando espaços de troca intergeracional.
O impacto dessas ações, segundo Kadu, é transformador. “O movimento negro nos ensina que podemos resistir ao racismo estrutural e criar um futuro de igualdade e justiça. É um caminho de libertação, que nos fortalece e inspira as próximas gerações a continuar essa luta.”
Tanto a Plenária Mirim, como o bate-papo e todas as ações do projeto, não foram apenas um espaço de reflexão, mas um marco no fortalecimento da identidade negra e da luta por reparação histórica. Ele reafirma o papel do Movimento Negro como protagonista na construção de uma sociedade mais inclusiva e empoderada, um legado que continuará inspirando vidas por gerações.